Garagem otimiza espaço com infraestrutura aérea para carregar ônibus elétricos em Bogotá, capital da Colômbia | Imagem: Folhapress
Ao contrário de SP, Bogotá investiu primeiro em infraestrutura para ter ônibus elétrico

Ao contrário de SP, Bogotá investiu primeiro em infraestrutura para ter ônibus elétrico

14% da frota de transporte público da cidade colombiana é movida a bateria, contra 0,9% da capital paulista

Carlos Petrocilo
BOGOTÁ


Enquanto São Paulo esbarra na falta de infraestrutura para ampliar sua frota de ônibus elétricos, Bogotá tem conseguido expandir o uso desse tipo de veículo em seu transporte público -e, assim, pode virar um exemplo para cidades brasileiras.

A capital colombiana já tem a segunda maior frota de ônibus elétricos da América Latina, atrás apenas de Santiago.

Enquanto a capital chilena tem cerca de 2.000 veículos desse tipo em seu sistema público, Bogotá conta atualmente com 1.486, número que tem crescido recentemente. Assim, 14% da atual frota de 10,6 mil coletivos da cidade são movidos a bateria.

Mas a liderança de Santiago pode não durar muito. A Colômbia já prepara uma licitação para dobrar a frota elétrica de ônibus de sua capital, que assim ultrapassaria 3.000 veículos.

Já em São Paulo, atualmente apenas 0,9% da frota é elétrica. Dados da gestão Ricardo Nunes (MDB) apontam que são 118 veículos desse tipo no sistema público de transporte, que ao todo conta com 13.289 coletivos.

A responsável por esse processo de eletrificação do sistema público de Bogotá é a TransMilenio, uma empresa pública que faz a gestão do transporte coletivo da cidade, semelhante ao papel desempenhado pela SPTrans em São Paulo. Diretora de planejamento da entidade, Deysi Rodríguez estima que o uso dos 1.486 coletivos elétricos geram uma redução anual de 94 mil toneladas de gás carbônico.

Como a Folha mostrou, em março, a gestão Nunes tem encontrado dificuldades para viabilizar sua promessa de encerrar o ano com 2.600 modelos movidos a bateria, o equivalente a 20% da frota. A falta de garagens com infraestrutura para carregar os veículos é o maior entrave para a expansão.

A prefeitura aponta como principal culpada pela demora a Enel, concessionária que atende o município.

A empresa também tem a concessão de energia em Bogotá. Na cidade, porém, o contrato já prevê que ela é responsável tanto pela construção da rede de distribuição para o carregamento dos ônibus quanto pela aquisição dos veículos. Isso não existe no caso paulistano

Segundo especialistas no setor, o poder público brasileiro falhou ao ignorar o processo de implementação da infraestrutura nos contratos com as concessionárias firmados em 2019, e somente em setembro de 2023 houve um aditivo para a subvenção da compra de ônibus em São Paulo.

"Não há qualquer compromisso seja das operadoras, seja da prefeitura ou da Enel de como e quando será feita essa implementação. Isso, aliás, está criando uma barreira à entrada de novos veículos no sistema, pois a prefeitura proibiu a incorporação de veículos a diesel", afirma o planejador urbano Rafael Drummond.



"Santiago e Bogotá estão mais avançados porque assumiram a responsabilidade da eletrificação e separaram todas as etapas dos contratos. Em São Paulo, a prefeitura espera que setor privado resolva o carregamento ao invés de ter um projeto próprio", diz Rafael Calabria, coordenador de mobilidade urbana do Idec (Instituto de Defesa do Consumidor).

A TransMilenio oferece dois modelos de concessão para o transporte público. No primeiro, a Enel é a responsável pelo pátio elétrico e poderá arrendá-lo às empresas de ônibus. No segundo, as próprias companhias assumem a construção da garagem.

Bogotá tem, hoje, nove garagens com a frota 100% elétrica, além de uma mista, com espaço para abrigar também ônibus movidos a diesel ou GNV (gás natural).

A maior delas, da Green Móvil, tem 40 mil quilômetros quadrados e abriga 406 carros, que transportam por dia 80 mil passageiros.

Inaugurada em abril de 2022, essa garagem custou R$ 100 milhões e tem 119 carregadores com 381 dispensadores de energia (mangueiras de recarga) que podem funcionar simultaneamente.

"Cada ônibus roda, por dia, 210 quilômetros em média, e a bateria tem autonomia para 266 quilômetros", conta Andres Cerquera, diretor de infraestrutura da Green Móvil.

Para dar conta do recado, a garagem conta com duas subestações com capacidade para abastecer uma cidade com 200 mil moradores e um sistema de combate a incêndio com duas caixas d'água.

Outra solução na cidade foi a construção de uma garagem com um sistema de carregamento aéreo, o que possibilitou carregar os 196 ônibus ao mesmo tempo em uma área de 28 mil metros quadrados.

O local, que tem como dono a empresa La Rolita, é rodeado por um morro na divisa de Bogotá com a cidade de Soacha. O pátio tem uma ilha no qual 21 supercarregadores ficam em um mezanino de ferro. Eles são usados para alimentar 183 mangueiras de abastecimento.

O tempo de recarga pode variar de duas a seis horas, a depender da quantidade de veículos sendo carregados simultaneamente. Um supercarregador tem energia suficiente para abastecer cinco ônibus ao mesmo tempo.

A garagem levou 18 meses para ficar pronta e permitiu que a La Rolita deixasse de emitir 6.000 toneladas de poluentes por ano, afirma o administrador do local, Sebastian Saenz. A empresa se destaca também por ter 60% de motoristas mulheres.

Operadores dos ônibus elétricos apontam como outro atrativo o baixo ruído. "Há muitos motoristas que preferem o elétrico porque se tornam mais tranquilo, pelo nível de ruído do motor em comparação com os modelos tradicionais e o câmbio e a embreagem são mais confortáveis", diz Jimmy Daraz, gerente de operação da Green Móvil, que emprega mil motoristas.

Com tais soluções e resultados, a Colômbia tem atraído as principais montadoras do setor. A chinesa BYD, por exemplo, fabricou 1.473 dos 1.486 ônibus de Bogotá -os outros 13 foram produzidos pela também chinesa Yutong.

Lara Zhang, gerente regional da BYD no país, afirma que Bogotá tem como principais vantagens a segurança jurídica nas licitações e os incentivos fiscais para importações de veículos.

O jornalista viajou a Bogotá a convite da BYD


Folha de S.Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2024/04/ao-contrario-de-sp-bogota-investiu-primeiro-em-infraestutura-para-ter-onibus-eletrico.shtml