Carolina Nogueira e Wanderley Preite Sobrinho
O presidente Lula (PT) sancionou hoje, em evento em Brasília, a lei que isenta do recolhimento de Imposto de Renda quem ganha até R$ 5.000 mensais. A mudança também concede descontos a rendas de até R$ 7.350. A nova regra entra em vigor a partir de 1º de janeiro.
O que aconteceu
Ausências dos presidentes do Senado e da Câmara escancaram crise com o Planalto. Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) está irritado com o governo após Lula indicar o advogado-geral da União, Jorge Messias, para a vaga de Luís Roberto Barroso no STF (Supremo Tribunal Federal). O parlamentar tinha preferência pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), seu aliado na Casa.Presidente da Câmara rompeu com o líder do PT. A relação do presidente da Casa e Lindbergh Farias (RJ) azedou durante a tramitação e votação do PL Antifacção. Ao longo do processo, o deputado petista não poupou críticas à escolha de Guilherme Derrite (PP-SP), secretário de Segurança Pública do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), para relatar a proposta do governo.
Gleisi minimiza ausências. Durante a cerimônia, a ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) agradeceu aos presidentes ausentes e afirmou que "a ausência dos presidentes em nada ofusca a importante condução e apoio que deram a essa matéria".
Relatores do IR e rivais em Alagoas viram as "estrelas" da cerimônia. Lula conseguiu uma foto inédita do Lira (PP-AL) e Renan juntos na sanção do IR. Não sem um certo climão. Os parlamentares foram relatores do projeto na Câmara e no Senado. Ao longo da tramitação, os dois trocaram farpas sobre a proposta.
Um de cada lado. Renan e Lira sentaram longe um do outro, um em cada ponta da primeira fila na cerimônia. Mas depois se cumprimentaram ao final do discurso de Lira.
O que é a lei
A lei foi aprovada no começo do mês em votação simbólica no Senado. Na Câmara, o texto passou em outubro por 493 a 0.A lei deve beneficiar cerca de 16 milhões de brasileiros. Além da isenção aos rendimentos de até R$ 5.000, haverá uma redução das alíquotas para quem recebe até R$ 7.350.
Isenção do IR é a principal pauta eleitoral do governo. O projeto é dos mais relevantes da gestão petista e deverá ser utilizado para melhorar a popularidade e ajudar na possível reeleição de Lula em 2026. A proposta também tem apelo nas bases eleitorais dos parlamentares e, por isso, contou com o apoio de todos os partidos na Câmara e no Senado.
Isenção de IR vai fomentar a economia, diz Lula. Em discurso após assinar a lei, o presidente afirmou que essa renda extra vai beneficiar uma parcela da população que tem maior propensão a consumir do que para poupar, diferentemente das classes mais ricas, que tendem a transformar em investimento quando recebem mais dinheiro. "Muito dinheiro na mão de poucos significa miséria. Pouco dinheiro na mão de muitos significa distribuição de riqueza", disse.
A economia não cresce por conta do tamanho da conta bancária do contribuinte. A economia cresce por conta do consumo que a sociedade pode ter a partir dos alimentos. Luiz Inácio Lula da Silva, Presidente da República
Rivais políticos foram os relatores
A tramitação do projeto no Senado foi marcada por troca de acusações entre os relatores. O senador Renan Calheiros (MDB-AL) não queria aprovar o texto de rival político, deputado, Arthur Lira (PP-AL), sem dar contribuições.Renan avaliou os cenários, pediu estudos e conversou com o Ministério da Fazenda. O senador realizou audiências públicas para discutir o tema e cogitou alterações no texto, mas as mudanças fariam o projeto retornar à Câmara, necessitando de mais tempo e negociações para passar a valer. Além do risco dos deputados derrubarem todas sugestões.
O senador acusou Lira de deixar "diversos jabutis maliciosamente inseridos". Já o deputado alagoano afirmou que a aprovação no Congresso "sepulta definitivamente as narrativas construídas sobre premissas falsas e confirma o que sempre esteve evidente: o relatório do deputado Arthur Lira é tecnicamente consistente, fiscalmente neutro e socialmente responsável".
Entenda a lei
A redução da alíquota será gradual. Pessoas com renda ligeiramente superior a R$ 5.000 por mês pagarão proporcionalmente menos do que indivíduos que ganham até R$ 7.350. Para quem ganhar acima desse valor, a cobrança do IR não terá mudanças.Uma professora, por exemplo, pagará menos imposto. A isenção fará com que uma docente que recebe o piso de R$ 4.867,77 da categoria deixe de pagar integralmente os R$ 312,89 que eram descontados na fonte mensalmente, segundo projeções do governo.
Exemplos de como fica o IR:
- Quem ganha R$ 5.500 terá seu imposto mensal reduzido de R$ 436,79 para R$ 190,47
- Quem ganha R$ 6.250 por mês terá redução de R$ 643,04 para R$ 496,48
- Quem ganha R$ 7.200 passará de R$ 904,29 para R$ 884,31
- Quem ganha acima de R$ 7.350 continua como está, com alíquotas de 27,5%
Nada muda na declaração de IR que será entregue em 2026. Para a declaração do IR referente ao ano-base de 2025 (a ser entregue no ano que vem), as regras de isenção que valem são as atuais, uma vez que a nova isenção só se aplicará aos rendimentos a partir de janeiro 2026.
Contrapartida
A perda de arrecadação com a isenção será de R$ 31,2 bilhões por ano. Pela legislação, é obrigatória a indicação de uma fonte para compensar a queda de receita. Lira manteve a sugestão do governo de fazer isso cobrando de quem ganha mais.A compensação do dinheiro que deixará de ser arrecadado será com uma tributação sobre os mais ricos. Será cobrado um imposto mínimo de contribuintes com renda superior a R$ 600 mil por ano (o equivalente a R$ 50 mil por mês), além de uma taxação sobre remessas de dividendos ao exterior.
Isenção de IR não compromete responsabilidade fiscal, disse ministro da Fazenda. Durante a cerimônia, Fernando Haddad disse que a possibilidade de isentar de forma total ou parcial o Imposto de Renda a trabalhadores que recebem até R$ 7.350 só foi concretizada depois que o governo conseguiu construir uma proposta que não impactasse o equilíbrio das contas públicas. O que, desta vez, foi feito com arrecadação dos mais ricos.
Esse projeto é neutro do ponto de vista fiscal. E tudo que nós fizemos para ajustar as contas, e que causa certa revolta em algumas pessoas, é que o andar de cima foi convidado a fazer o ajuste, não foi o andar de baixo. Fernando Haddad, ministro da Fazenda
Dividendos enviados ao exterior ficam sujeitos a uma tributação de 10% na fonte, independentemente do valor. Hoje, esses dividendos não são tributados. Muitos profissionais liberais que trabalham em regime "pejotizado" (como pessoa jurídica, em vez de carteira assinada) conseguem evitar total ou parcialmente o pagamento de imposto ao retirar sua renda dos dividendos das suas empresas, que são isentos do pagamento de IR. A adoção do imposto mínimo busca reduzir essa distorção.
As alíquotas sobre a população mais rica não passarão de 10%. A cobrança será gradual para rendimentos que ultrapassarem R$ 600 mil por ano (R$ 50 mil por mês), começando por uma faixa de 2,5%. O percentual mais elevado incidirá sobre pessoas com rendimento anual acima de R$ 1,2 milhão (R$ 100 mil por mês).
A cobrança mínima para renda superior a R$ 50 mil por mês deve atingir somente 0,13% dos contribuintes. O grupo é formado por cerca de 140 mil pessoas que atualmente recolhem em média 2,54% de IR, segundo o Ministério da Fazenda.
A cobrança vai considerar o que já foi recolhido pelas faixas de renda mais altas. Caso um contribuinte com rendimento anual de R$ 1,2 milhão recolha 8% de Imposto de Renda, ele terá que pagar apenas mais 2% para atingir os 10%. Se um contribuinte com R$ 2 milhões já pagou 12% de IR, não pagará nada a mais.
Lucros e dividendos entrarão no cálculo. A tributação da pessoa física será contabilizada por salários, aluguéis, dividendos e outros rendimentos. Não entram na compensação eventuais lucros com a venda de bens, herança, poupança, aposentadoria por doença grave e indenizações.
As regras levam em conta o imposto pago por pessoas jurídicas. A soma da tributação como pessoa jurídica e como pessoa física não poderá superar 34% do valor dos dividendos pagos por empresas não financeiras, ou 45% no caso de empresas financeiras.
Os sócios de empresas, por exemplo, devem pagar mais. O dono de uma companhia que recebe R$ 985 mil por ano e tem uma alíquota efetiva de 2,7% passará a pagar mais 3,72%, porque sua alíquota mínima será de 6,42%, segundo a tabela apresentada pelo ministério.
Exemplos de como fica o IR:
- Renda anual de até R$ 600 mil - Sem cobrança adicional de imposto
- Renda anual de R$ 750 mil - Alíquota de 2,5%, equivalente a R$ 18.750
- Renda anual de R$ 900 mil - Alíquota de 5%, equivalente a R$ 45 mil
- Renda anual de R$ 1,05 milhão - Alíquota de 7,5%, equivalente a R$ 78.750
- Renda anual de R$ 1,2 milhão - Alíquota de 10%, equivalente a R$ 120 mil
A compensação deve arrecadar R$ 76,2 bilhões em três anos. O texto final implica em um recuo de Lira, que pretendia reduzir para 9% o percentual cobrado de contribuintes de alta renda. O motivo foi a pressão da população, que reclamou de proteção aos super-ricos.
A mudança foi promessa eleitoral de Lula e deve entrar na campanha presidencial do ano que vem. A aprovação da isenção era prioridade da gestão petista e deverá ser uma das principais bandeiras para Lula tentar a reeleição em 2026. Como também tem apelo junto às bases eleitorais de deputados e senadores, a mudança contou com o voto favorável de todos os partidos.
Uol
https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2025/11/26/lula-sanciona-lei-que-isenta-ir-para-quem-ganha-ate-r-5-mil-por-mes.htm




