Edinho Silva: ex-prefeito se reúne com ministros, parlamentares e lideranças em busca de apoio para comandar sigla - Foto: Cristiano Mariz/Agência O Globo - 9/4/2024 |
Novo presidente do PT, Edinho Silva diz que melhora na popularidade vai manter aliados com Lula

Novo presidente do PT, Edinho Silva diz que melhora na popularidade vai manter aliados com Lula

Alinhado ao ministro Sidônio Palmeira, da Secretaria de Comunicação, Edinho reconhece a crise de popularidade do governo, mas diz estar "confiante" de que a aprovação do presidente vai crescer no 2º semestre

Por Andrea Jubé e Isadora Peron, Valor

Eleito com o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o novo presidente do Partido dos Trabalhadores (PT), Edinho Silva, disse ao Valor, na primeira entrevista exclusiva após a divulgação do resultado da eleição petista, que, antes de tomar posse, vai procurar dirigentes e líderes partidários da base para deflagrar as conversas sobre os palanques para 2026 e tentar reeditar a frente ampla de 2022. "Temos que consolidar rapidamente um diagnóstico, Estado por Estado."

Ele vai ser o responsável por coordenar a campanha de Lula à reeleição. Alinhado ao ministro Sidônio Palmeira, da Secretaria de Comunicação da Presidência, Edinho reconhece a crise de popularidade do governo, mas diz estar "confiante" de que a aprovação do presidente vai crescer já no segundo semestre. A se confirmar esse quadro, diz que a "perspectiva de vitória" vai conter a eventual debandada de aliados.

Conhecido pelo estilo conciliador, ele chega ao posto num clima de tensão política, em pleno confronto do governo com o Congresso, após a derrota imposta a Lula no episódio do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Ele rebateu críticas de que o PT estaria estimulando a divisão da sociedade.

"Achar que impõem uma derrota ao Lula e que isso não teria reação é muita ingenuidade, mas não significa que ele tenha aberto mão do diálogo."


Próximo do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ele disse que o PT não terá uma postura passiva sobre a economia, mas "não vai trabalhar contra o governo". Igualmente ligado ao presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, Edinho criticou os juros altos, mas defendeu o "voto de confiança" no chefe da política monetária.

Quatro vezes prefeito de Araraquara (SP) e ex-ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom) de Dilma Rousseff, Edinho assume o PT após o mandato de oito anos de Gleisi Hoffmann, hoje ministra da articulação política, e de cinco meses do senador Humberto Costa (PE), que comandará a transição no cargo. A posse dele ocorrerá no início de agosto.

Representante da tendência hegemônica Construindo um Novo Brasil (CNB), Edinho também terá de pacificar o PT, que saiu rachado da eleição nacional. O principal embate interno ainda mira o controle da Secretaria de Finanças, hoje com Gleide Andrade, aliada de Gleisi. A seguir os principais pontos da entrevista ao Valor:

Valor: Qual a sua prioridade nesse começo de gestão?

Edinho Silva: Reorganizar o partido, no sentido de construirmos um PT que dê conta dos desafios imensos que estão colocados, de um partido que dialoga com a sociedade, tem um projeto de país, e tem de enfrentar um pensamento crescente de inspiração fascista.

Valor: O senhor fala do avanço da extrema direita no mundo?

Edinho: Infelizmente estamos vendo isso no mundo todo, não dá para minimizar o que estamos vendo em relação aos imigrantes nos Estados Unidos. O crescimento desse pensamento tem reflexo na política brasileira. A tentativa de golpe no 8 de janeiro teve concepções fascistas, uma organização planejou matar o presidente da República, o vice e o presidente do Tribunal Superior Eleitoral.

Valor: E qual o papel do PT nesse cenário?

Edinho: É um partido que se dispõe a defender a democracia, o fortalecimento das instituições, do ponto de vista da consolidação de um país democrático. Só um partido muito forte e organizado pode dar conta desse desafio.

Valor: Qual a estratégia para as eleições?

Edinho: Temos que consolidar rapidamente um diagnóstico, Estado por Estado, e pensar em uma política de alianças que dê sustentação para reeleger Lula.

Valor: Vai ter embate com aliados pelas cabeças de chapa?

Edinho: O PT não tem possibilidade de ser hegemônico nas eleições, seria falar algo que não tem base na realidade. Onde o PT tiver condições de fazer disputa, teremos candidatos. Onde não tiver, temos que priorizar o diálogo com nossos aliados históricos.

Valor: A reeleição de Lula é prioridade?

Edinho: Ela é central para esse processo de reconstrução do país.

Valor: Não tem um plano B?

Edinho: Não tem. Sem a reeleição de Lula o retrocesso para o Brasil será gravíssimo do ponto de vista da reconstrução das políticas públicas, de um projeto de país, e do risco de abrirmos espaço para o avanço do fascismo.

Valor: O PT está sendo criticado, até por aliados, de investir no debate ricos x pobres e estimular a divisão na sociedade. Como responde a isso?

Edinho: Não acho que seja um debate de ricos contra pobres. O que eu acho é que temos uma sociedade de privilégios, de supersalários. Por que tem servidor público recebendo R$ 100 mil, enquanto a maioria dos brasileiros não ganha nem R$ 2 mil? A gente vai continuar desonerando setores da economia que não precisam ser desonerados? Não é rico contra pobre, é sobre combater privilégios.

Valor: O Congresso também questiona o modelo do governo de equilibrar as contas pelo aumento da receita e não pelo corte de gastos, como foi o caso do IOF. Como vê essa cobrança?

Edinho: Não é correto dizer que o aumento do IOF eleva a carga tributária. No governo Bolsonaro, a alíquota era de 6% e ninguém falava de aumento da carga tributária. O governo quer debater que país queremos, um país de privilégios ou de igualdade social? O Brasil não pode conviver com R$ 800 bilhões de renúncia fiscal, vamos debater quais setores estão sendo beneficiados.

Valor: Qual sua proposta?

Edinho: A renúncia fiscal tem que ter um sentido. Hoje você tem grandes corporações sendo desoneradas, mas o pequeno e o médio empresário, o empreendedor e o assalariado pagando impostos. Não pode existir setores beneficiados sem um limite temporal.

Valor: Na esteira desse debate, Lula está sendo acusado de fazer uma guinada à esquerda e dar as costas à frente ampla que o elegeu. É possível abrir mão dessa frente ampla novamente?

Edinho: O Lula é o Lula, ele não saiu do lugar dele, continua defendendo o mesmo Brasil de sempre. Mas diante da derrota imposta ao governo pelo Congresso [que suspendeu o decreto do IOF], é evidente que tinha que ter uma reação. Lula é um presidente forte, não é o Jair Bolsonaro, não é o Michel Temer. Achar que impõem uma derrota ao Lula e que isso não teria reação é muita ingenuidade. Ele reagiu porque não lhe sobrou outro caminho, mas não significa que tenha aberto mão do diálogo.

Valor: E como vai ficar a frente ampla, num cenário em que partidos do Centrão planejam desembarcar do governo?

Edinho: Quero conversar com o senador Humberto Costa, vamos fazer uma transição, e juntos, vamos procurar os presidentes dos partidos que fazem tradicionalmente alianças conosco, e também buscar as lideranças que garantiram a vitória de Lula em 2022.

Valor: Isso será suficiente para conter a debandada?

Edinho: Talvez criar espaços de diálogo constante para que a gente possa não só procurar os aliados às vésperas do período eleitoral, mas começar a conversar a partir de agora, colher opiniões.

Valor: Defende que Geraldo Alckmin seja mantido na vaga de vice?

Edinho: Acho o Alckmin uma liderança fundamental para o Brasil. Agora, o prefeito de Recife, João Campos, acabou de assumir o PSB, temos que abrir um diálogo com ele.

Valor: Como será o cenário em 2026 pela ótica da oposição? Uma eventual prisão de Bolsonaro influenciará a campanha?

Edinho: Acho que eles têm um problema imenso porque não têm nome. E o que simboliza esse campo é o ódio, a sociedade está saturada dessa intolerância, da manifestação homofóbica, racista. Mas eu acho que a gente não tem que se preocupar de que forma eles vão resolver essas contradições, temos que nos preocupar com a nossa construção política.

Valor: E quem o senhor acha que vai ser o adversário de Lula?

Edinho: Eu acho que eles estão com muitos problemas...

Valor: Mais do que vocês?

Edinho: Nós somos o governo. Claro que é necessário melhorar a popularidade do presidente. Não estou dizendo que isso não seja importante.

Valor: Como fazer isso?

Edinho: Dialogando com a sociedade. A comparação dos resultados do governo Lula com o governo Bolsonaro é uma coisa impressionante. A gente tem que fazer a sociedade enxergar esses resultados.

Valor: Então existe um problema de comunicação do governo?

Edinho: Jogar a responsabilidade toda sobre a comunicação não é justo, porque a comunicação comunica o que a política define. O que nós precisamos é aprimorar a nossa linha política, e nós temos muito o que entregar. Eu estou muito confiante na melhora do governo Lula já no segundo semestre.

Valor: O PT era cobrado de não saber usar as redes sociais como a direita, mas conseguiu emplacar uma estratégia digital diante da crise do IOF. Teve uma virada de chave?

Edinho: Não tem magia. Isso é outra coisa que virou um dogma: a direita é boa de rede, a esquerda é ruim. Mas abre o algoritmo para eu saber por que se impulsiona mais a fala de A do que a fala de B. Por que as redes não mostram para a sociedade o algoritmo?

Valor: E o que fazer nesse impasse?

Edinho: Tem que regulamentar as redes, mas isso não significa censura. Censura é quando você controla o conteúdo. Isso eu sou contra. Mas quem produz "fake news" tem que responder por isso.

Valor: Hoje a avaliação é que o nome do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, é o mais competitivo da oposição, e vai atrair os partidos de centro e da direita. Acredita que ele será candidato à Presidência?

Edinho: O mundo político se move pela perspectiva de vitória. Eu não tenho nenhuma dúvida de que nós vamos chegar na virada do ano com a aprovação do governo Lula muito melhor. Então, as nossas perspectivas de vitória em 2026 são reais. Com o governo Lula consolidando a possibilidade de vitória, eu não acredito nesse movimento [de debandada do centro], porque a política é pragmática.

Valor: Como vê a crise entre Executivo e o Congresso?

Edinho: Nós estamos vivendo um momento no Brasil de desarranjo institucional. Quando o Congresso Nacional executa R$ 52 bilhões do Orçamento, isso não é mais presidencialismo. A Constituição Federal diz que nós somos presidencialistas, mas a política real estabeleceu um semiparlamentarismo, um semipresidencialismo.

Valor: E como fazer para mudar esse quadro?

Edinho: Ou a gente tem lideranças que sentem à mesa, que criem uma agenda de interesse nacional para tirar o Brasil desse embaralhado, ou o país vai mostrar limites daqui a pouco de instabilidade, que vai afetar até a economia. Precisamos ter lideranças que coloquem os interesses do país no primeiro plano, achar um ponto de equilíbrio.

Valor: Qual é esse ponto?

Edinho: De que forma a gente pode deixar o parlamentar com o direito de indicar investimentos para suas regiões sem virar uma descaracterização do presidencialismo? E temos que fazer reforma política eleitoral, porque esse modelo de hoje é um dos motivos da instabilidade. Temos que abrir o debate no Brasil sobre o voto em lista, achar um modelo que fortaleça os partidos.

Valor: Mas a população perdeu a confiança nos partidos.

Edinho: É melhor para a estabilidade democrática fortalecer os partidos do que pulverizar o poder na individualidade do parlamentar. Temos que fazer isso para salvar a democracia brasileira. E a única liderança que tem autoridade política para fazer essa concertação que o Brasil precisa é Lula.

Valor: Gleisi Hoffmann, quando era presidente do PT, tinha embates com o ministro da Fazenda. Como será a sua relação com Haddad?

Edinho: Cada um tem a sua forma de fazer política. Quem estabelece a política econômica é o presidente Lula, e essa política econômica é desempenhada pelo Haddad. Não há como fortalecermos o governo Lula sem fortalecermos Haddad.

Valor: Então PT vai caminhar alinhado com Haddad?

Edinho: Não significa também que o PT vai ser passivo. O PT tem que ter proposta, mas não significa que vai trabalhar contra o governo?

Valor: E a relação do PT com o presidente do Banco Central?

Edinho: Claro que eu não fiquei feliz com a última alta da taxa de juros. Eu achei, inclusive, que ela ficaria no mesmo patamar. Agora, se a gente não der um voto de confiança ao Galípolo, evidente que isso não ajuda. Acho que a gente tem que debater instrumentos para entender melhor a lógica da condução dos juros.

Valor: Como assim?

Edinho: Eu acho que o IBGE deveria tornar público o núcleo da inflação, e o que é impacto sazonal dos preços. Não digo para alterar a forma de cálculo do índice, mas dizer para a população que aqui tem 2%, 3% do que é núcleo, e 1,5% do que é sazonal.

Valor
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