Stud Saia Justa desafia domínio masculino, divide gastos para cuidar de égua e traça estratégias para corridas
Por Thayná Rodrigues
Um grupo de mulheres turfistas tem chamado a atenção no Hipódromo da Gávea. Elas levam faixas para torcer por sua égua, Opus Dei - a Pupu -, fazem barulho e há quem diga que até incomodam os mais conservadores nas tribunas do Jockey Club Brasileiro (JCB). A paixão não é só de arquibancada. Além da torcida, há um empenho nos bastidores, que inclui o trato do animal e as estratégias de corrida.
Criado em 2024, o Stud Saia Justa reúne 17 cotistas apaixonadas por cavalos que sonham aumentar a visibilidade feminina no esporte. No grupo de proprietárias há especialistas, como a ex-joqueta e agora treinadora Victoria Mota, e profissionais com formações de outras áreas, como a fisioterapeuta Mariana Leite, que se aproximou do turfe após fazer um trabalho de reabilitação com crianças com deficiência no JCB.
- Trabalho com hipoterapia (terapia assistida por cavalos) e estudei a vida inteira aqui dentro. Quando começou o projeto, logo quis entrar. A gente aqui fala de amor pelo animal - diz Mariana.
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A treinadora Victoria Mota com a égua Opus Dei - Foto: Alexandre Cassiano
Dominado por homens
Salvo exceções como Marlene Fernandes Serrador, reconhecida como uma das grandes damas do turfe brasileiro - e que dá nome até a uma competição -, a presença feminina se limitava às mulheres de turfistas ou a acompanhantes de parentes (homens). Agora, a corrida é por mais diversidade no esporte - do gênero à possibilidade de ser dono de um animal. Livia Bittencourt, superintendente do JCB, joqueta amadora e integrante do Stud Saia Justa, explica:
- O trato do cavalo custa entre R$ 2,5 mil e R$ 3 mil por mês. Fica difícil uma só pessoa dispor desse valor mensal por longo prazo. Isso impede muita gente de se aproximar do esporte. Por isso, decidimos criar um sistema de cotas para dividir tanto o valor de compra do animal quanto os cuidados. Nosso coletivo é o proprietário do animal e tem foco em trazer mais mulheres para esse mundo majoritariamente masculino.
Tutora de um cão vira-lata, a jornalista Marcella Sobral, de 50 anos, conta que tem mais gastos com seu animal doméstico do que com sua égua:
- Os valores mais baixos, que começam em R$ 10, melhoram as possibilidades de acesso. E não importa se alguém tem uma ou dez cotas, a decisão de cada um tem o mesmo peso.
Por ano, um cavalo disputa cerca de 12 páreos. Muitas vezes, a decisão sobre a quantidade de competições e em que condições o equino as enfrenta é tomada pelos donos do animal, orientados por quem sabe - no Saia Justa, a função cabe à treinadora Victoria Mota, ex-joqueta e filha de ex-atletas. Aos 26 anos, ela é cotista e, além da égua, treina outro puro-sangue, Tabaozeppe, com quem divide cotas com outras 26 pessoas.
Às vésperas de uma competição, meses atrás, Victoria percebeu que Opus Dei estava com um incômodo na ferradura. A treinadora informou ao grupo e sugeriu que o mais aconselhável para seu bem-estar seria poupá-la da corrida:
- Foi unânime a decisão de priorizar o bem-estar, mesmo com o prejuízo do valor arcado com o registro (na prova).
'Cavalo não é pet'
A sensibilidade e a maneira como tratam o animal não são as mesmas dos proprietários homens, que, segundo elas, tendem a ter perfis mais dominadores e menos carinhosos. Distinguir-se na lida ou paparicar vez ou outra não quer dizer que elas passem demais a "mão na sua crina".
- Meu pai (o ex-jóquei Alex Mota) dizia: "a gente também não pode amar demais. O cavalo tem que saber que não é pet". E é verdade. O animal tem que entender que o foco no páreo é importante - frisa a treinadora, que está grávida e, até julho, deve entrar de licença-maternidade.
O Globo
https://oglobo.globo.com/rio/noticia/2025/05/11/de-fisioterapeuta-a-treinadora-grupo-de-proprietarias-cotistas-de-cavalos-chamam-atencao-no-joquey.ghtml