Mudança no regimento permitirá a criação inédita de uma sexta CPI simultânea; o anúncio ocorre uma semana após o ex-presidente da Câmara Milton Leite apresentar uma notícia-crime contra advogados do Jockey Club por racismo.
Por João de Mari, Paulo Gomes, Rodrigo Rodrigues, g1 SP e TV Globo
Líderes das bancadas da Câmara Municipal de São Paulo decidiram nesta terça-feira (21) mudar o próprio regimento para abrir uma nova Comissão Parlamentar de Inquérito: a CPI do Jockey. O objetivo é investigar denúncias de que o Jockey Club de São Paulo teria usado indevidamente recursos públicos destinados à restauração do patrimônio histórico.
A nova CPI sobre o Jockey Club será a sexta em funcionamento na Casa. Nunca na história da Câmara houve seis comissões tramitando ao mesmo tempo. Para viabilizar a criação da nova comissão, porém, será apresentada uma mudança no regimento, por meio de um Projeto de Resolução.
Hoje, o regimento interno da Câmara permite o funcionamento simultâneo de até cinco CPIs.
Estão em andamento na Câmara as CPIs do HIS (Habitação de Interesse Social), dos Pancadões, da Íris, do Metanol e do Jardim Pantanal.
O dinheiro em questão foi obtido por meio de incentivos fiscais dos governos federal e municipal - principalmente pelo mecanismo conhecido como Transferência do Direito de Construir (TDC).
🔎 A TDC é uma regra da cidade que diz que, se o dono de um prédio ou casa não pode ampliar sua construção porque o imóvel é tombado ou protegido pelo patrimônio histórico, ele pode vender esse direito para outra pessoa mediante autorização da prefeitura. Assim, o outro terreno pode construir além do permitido, e o dono do imóvel protegido ganha um dinheiro como compensação.
A proposta ainda será analisada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e deverá passar por duas votações em plenário. Segundo os vereadores, a alteração será excepcional e temporária, válida somente para o biênio 2025/2026.
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Plenário da Câmara Municipal de São Paulo - Foto: Douglas Ferreira/ Rede Câmara SP
CPIs na Câmara
No começo do ano, as duas primeiras CPIs que obtiveram as assinaturas necessárias para serem instaladas foram a das fraudes na venda de imóveis de interesse social e que pretende investigar as enchentes no Jardim Pantanal.Após a aprovação dos próprios vereadores para a realização destas CPIs, a base do prefeito Ricardo Nunes (MDB) não indicou os membros para formá-las dentro do prazo.
Com isso, elas perderam validade, e duas outras foram instaladas em seu lugar, a CPI dos Pancadões e a CPI da Leitura das Íris. A oposição judicializou a não indicação dos componentes, e a Justiça então determinou a instalação das duas CPIs originais.
Nesta terça-feira (21), foi instalada uma quinta Comissão Parlamentar de Inquérito, a CPI do Metanol.
Segundo o regimento interno da Câmara, poderão funcionar na Câmara até cinco CPIs ao mesmo tempo, sendo que o mínimo é de duas CPIs. As outras três são, conforme o regimento, "em caráter excepcional e por motivo relevante, mediante deliberação em plenário pela maioria absoluta dos vereadores".
Em nota, a Câmara afirmou que a decisão foi tomada de forma conjunta pelos líderes em razão da "extrema gravidade das denúncias que envolvem o Jockey Club".
"Além de dever cerca de R$ 800 milhões em impostos, é suspeito de má utilização de dinheiro público que deveria ter sido destinado para restauro do patrimônio. O regimento será alterado justamente pelo caráter excepcional do assunto", diz nota.
A Câmara não respondeu, no entanto, qual a justificativa para a urgência da instalação de uma CPI além do limite regimental, se extrapolar o limite não impactará nas atividades das outras cinco, e se há o risco de banalizar o caráter excepcional previsto em regimento.
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O ex-vereador Milton Leite (União Brasil) recebe o Colar de Honra ao Mérito Legislativo, a maior honraria da Alesp. - Foto: Divulgação/Alesp
Injúria racial
O anúncio da mudança no regimento ocorre uma semana após o ex-presidente da Câmara Municipal Milton Leite apresentar uma notícia-crime à Polícia Civil contra quatro advogados do Jockey Club por racismo.O ex-vereador alega que os advogados se referiram a ele como "antropoide desvairado" em uma petição durante o processo de recuperação judicial do Jockey Club. O termo antropoide é usado em dicionários para se referir a macacos, como orangotango e chimpanzé.
"Os representados são todos homens, brancos, com nível superior de escolaridade, advogados e empresários, os quais certamente nunca experimentaram o sofrimento com qualquer ato de racismo equivalente ao praticado contra a vítima", escrevem na representação os advogados Luciano Vitor Engholm Cardoso e Fernando Capez, que representam Leite no caso.
Procurado, o Jockey Club de São Paulo não respondeu até a última atualização desta reportagem.
G1
https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2025/10/21/camara-de-sp-muda-regimento-para-abrir-cpi-sobre-uso-de-incentivos-fiscais-pelo-jockey-club.ghtml