Experiência, moderação e atuação na crise com os EUA fazem do vice um nome forte em SP.Ricardo Stuckert/PR |
Picolé de chuchu entra no cardápio do PT para 2026

Picolé de chuchu entra no cardápio do PT para 2026

Após tropeços de Tarcísio, Alckmin ganha força entre lulistas para disputar o governo paulista em 2026.

Lydia Medeiros

Quando foi derrotado nas eleições presidenciais de 2018, depois de obter menos de 5% dos votos no primeiro turno, o médico Geraldo Alckmin afastou-se da política e voltou ao ofício. Trabalhou como voluntário em hospitais do SUS, fazendo aplicações de acupuntura. A vida estava tranquila até que, no início de 2022, uma articulação comandada por Fernando Haddad o levou à chapa de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais, representando o PSB.

O vice-presidente, aos 72 anos, tem uma trajetória singular na política: vereador, prefeito de Pindamonhangaba, deputado estadual, deputado federal, vice-governador e quatro vezes governador de São Paulo. Antes da derrota de 2018, disputou a Presidência em 2006, numa campanha desastrada em que conseguiu ter menos votos no segundo turno do que no primeiro. A disputa espalhou para o Brasil o apelido criado por Paulo Maluf em 2002, o "picolé de chuchu". Para completar, Alckmin é anestesista: sabe fazer alguém dormir.

Alckmin sempre disse que o apelido não o incomodava e que seu estilo era aquele mesmo, mais discreto e menos "palanqueiro": "Eu acho que a população não quer um showman, ficar fazendo pirotecnia, espetáculo", disse na campanha de 2022.

As características que o eleitor transformou em memes são hoje um trunfo para o governo Lula. A voz quase monocórdia, a dicção cuidadosa, o perfil de político experiente, ponderado e aparentemente imune a arroubos ideológicos colocaram Alckmin no centro da grave crise gerada pelas tarifas impostas por Donald Trump aos produtos exportados pelo Brasil.

Lula escalou o vice para liderar um comitê de negociação com o governo americano. Nos últimos dias, Alckmin teve encontros com representantes empresariais. Recebeu elogios e até um "sonoro agradecimento" da agroindústria. Ele escuta os empresários, enquanto espera uma resposta do governo dos Estados Unidos sobre a proposta brasileira de negociação comercial.

A tarefa do "picolé de chuchu" é dura, mas sua atuação tem o mérito de tirar as paixões da sala de negociação. Coisa de anestesista.

Alckmin é uma espécie de curinga no baralho do governo Lula. As sucessivas hesitações e tropeços do governador paulista Tarcísio de Freitas na crise Brasil-Estados Unidos fizeram com que Alckmin entrasse no cardápio de opções de uma ala do PT, o chamado campo lulista, para eventual candidatura ao Palácio do Bandeirantes.

Tarcísio deu-se mal na tentativa inicial de negociar com os EUA. Não tinha mandato para isso e, ao mesmo tempo, entrou em rota de colisão com a família Bolsonaro. Ele continua sendo um refém eleitoral do ex-presidente.

Entre empresários de São Paulo, o estado mais afetado pelo tarifaço de Trump, tornaram-se inevitáveis as comparações entre o governador e o vice-presidente. Sobressaíram comentários sobre a inexperiência política de Tarcísio. Depois de abraçar Alckmin na vice de Lula em 2022, o PT poderá ter de patrocinar um movimento "volta, Alckmin" em 2026. Seria irônico porque ele governou São Paulo por duas décadas, sempre com a oposição ferrenha dos petistas.

Congresso em Foco
https://www.congressoemfoco.com.br/coluna/110324/picole-de-chuchu-entra-no-cardapio-do-pt-para-2026?s=WA