O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e Gabriel Galípolo, indicado para a presidência do Banco Central - Foto: Cristiano Mariz/Agência O Globo |
Taxação do IOF acirra tensão entre Galípolo e Haddad

Taxação do IOF acirra tensão entre Galípolo e Haddad

Por Malu Gaspar


A movimentação de bastidores em torno do anúncio das medidas de ampliação do Imposto de Operações Financeiras (IOF) e o recuo que veio depois aumentaram a tensão e acirraram a desconfiança entre o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, e a Fazenda de Fernando Haddad.

Galípolo não só não gostou do teor das medidas, em especial a taxação dos fundos de investimento no exterior, como também se irritou com o fato de o secretário-executivo da Fazenda, Dario Durigan, ter dito aos jornalistas que ele tinha sido consultado, depois da entrevista coletiva sobre as novas regras.

Em meio ao barata-voa de banqueiros e gestores de investimento trocando mensagens e se telefonando freneticamente, o presidente do BC passou a responder a quem o procurava, no mercado, na política e no jornalismo, que o Ministério da Fazenda já cogitava implementar essas mesmas medidas desde o início do ano, mas que ele sempre resistiu. Agora, tinham feito contra a sua vontade.

Entre as queixas a respeito das mudanças anunciadas por Haddad, a mais crítica era específica sobre a taxação de operações de câmbio em fundos de investimento - o correspondente a cerca de R$ 2 bilhões, pouco perto dos R$ 50 bilhões previstos pela Fazenda até 2026, mas que de acordo com os operadores de mercado inviabilizaria as compras de ativos no exterior para compor fundos como os multimercado.

Nas mesas de operação, a medida foi vista ao mesmo tempo como barbeiragem e um sinal de que o governo teria a intenção de no futuro controlar capitais, criando impostos e outras barreiras para impedir que investidores coloquem seu dinheiro fora do Brasil.

De acordo com os interlocutores do presidente do BC, Galípolo ficou preocupado com o estrago que um aval seu a essas medidas poderiam causar na credibilidade do banco e em sua imagem pessoal - primeiro pela má repercussão das medidas, e depois por parecer que ele não teria compreendido seu impacto.

Nessas conversas, Galípolo disse ainda que alertou Haddad de que, se a Fazenda não desmentisse Durigan, ele mesmo o faria. Daí, segundo ele, o tuíte postado pelo ministro da Fazenda às 20h20m de quinta-feira.



Na verdade, de acordo com o relato de fontes que acompanharam de perto o tema, o presidente do BC foi avisado das medidas de forma rápida após uma reunião de trabalho com a equipe da Fazenda sobre vários assuntos. Não houve, portanto, uma consulta, nem mesmo informal. Mas Galípolo também não teria feito nenhum comentário sobre a informação que acabara de receber.

Outra afirmação feita pelo presidente do BC a interlocutores na noite de quinta é de que o recuo de Haddad estava relacionado a outro alerta que ele teria feito pessoalmente, este ao presidente Lula: o de que a dura reação do mercado acabaria levando o banco a retomar o ciclo de alta dos juros.

Em pouco tempo, os movimentos e falas de Galípolo chegaram aos ouvidos de Haddad e sua equipe, que passaram a negar que o recuo tenha sido resultado de qualquer interferência política. O ministro da Fazenda também gastou saliva negando ter participado remotamente da reunião ocorrida no Palácio do Planalto entre os ministros Rui Costa (Casa Civil), Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) e Sidônio Palmeira (Secom) - até porque, segundo ele, a reunião era sobre outro assunto.

Na entrevista coletiva desta manhã sobre o recuo nas medidas, Haddad afirmou que decidiu voltar atrás na taxação dos fundos por conta própria e em conversas com seu time, depois de receber "subsídios de operadores do mercado" e entender que, por ter um efeito financeiro "residual", não valia a pena insistir em uma regra que poderia levar a uma compreensão errada das intenções do governo - que não teria nada a ver com o controle de capitais.

Haddad também afirmou que Sidônio e a Presidência da República só foram comunicadas sobre sua decisão depois que ela já tinha sido tomada.

Definida a questão, ficou em Brasília a impressão de que Haddad está fraco e Galípolo, forte - o que, na Fazenda, é visto como resultado da movimentação do presidente do BC nos bastidores. O que obviamente não agradou a pasta. Ficaram quites: se é fato que Galípolo atuou para minar as medidas de Haddad, agora também é verdade que a Fazenda quer ver o dirigente do Banco Central pelas costas.

O Globo
https://oglobo.globo.com/blogs/malu-gaspar/post/2025/05/taxacao-do-iof-acirra-tensao-entre-galipolo-e-haddad.ghtml